quarta-feira, 4 de abril de 2012

Bondade culpada


Eu trabalhava como encarregada administrativa de uma obra. Aquela foi uma experiência que jamais esquecerei. Como aquelas pessoas que trabalham em um esforço até mesmo desumano, conseguem levar suas vidas, em rostos marcados pela dor, com um leve sorriso? Jamais conseguirei explicar.
Existia um jovem na obra que para mim era diferente. Menino bom, coração puro e eu ávida por querer que todos dessem muito bem em suas vidas lhe dizia:
_Meu jovem você é novo, precisa pensar em estudar. Eu sei que a vida e a falta fazem isso com a gente, porem tente conciliar.
 Ele sorria num sorriso inocente e dizia:
_Sim, eu vou estudar.
Em um dia de muita correria na obra em que a técnica em segurança do trabalho não se encontrava, fui orientada pelo mestre de obras a ajudar aquele garoto para colocar o cinto de segurança e fixá-lo em algum lugar seguro. E lá fui eu. Olhei para um lado e para outro e vi um pilar de sustentação de viga bem ali atrás dele que trabalha sem se importar com sua segurança. Levei até ele o cinto, fiz com que ele o colocasse e pendurasse o gancho aonde eu pensava que seria seguro. E assim ele fez.
E o serviço continuava. Eu me afastei dali. A obra era em um galpão muito grande e poderia facilmente não se visto nas extremidades. Quando cheguei à outra extremidade me veio outro funcionário muito assustado
_Corre..._ Disse ele me puxando pelo braço
_O que houve? _ indaguei extremamente assustada
_Ricardo caiu do andaime.
Naquele momento meu coração gelou. Como isso poderia acontecer? Como se tivesse assas, sai correndo. Quando cheguei perto dele a visão que tive fez minha culpa aumentar, ele caiu porque eu não havia lhe indicado o lugar certo para pendurar o cinto. Ele estava banhado em sangue, seu braço quebrado não se segurava sozinho no ar e num impulso de esconder minha culpa lhe segurei pelo braço apoiado no meu ombro e o coloquei debaixo de uma torneira para lavar todo aquele sangue. Enquanto o lavava eu ia conversando com ele, pedi desculpas pelo meu ato e ele como se misericórdia fosse assessório de fabrica me olhou com um olhar de dor e disse:
_Eu estou bem. Essas coisas acontecem e tenho muito é que te agradecer pelo cuidado que está tendo comigo.
Eu não me contive, me virei e uma lagrima rolou. O que eu podia dizer? Ele era muito maior do que tudo aquilo.
Arrumei um carro, o mandei para o hospital e ele foi me agradecendo mais uma vez.
Aquela imagem nunca me saiu da cabeça. Como ele numa dor que julgo insuportável poderia ainda me reter alguma consideração? E eu naquele momento entendia que um gesto pode mudar tudo. Ele que estava acostumado aos maus modos da pobreza, recebeu de mim um cuidado culpado, porém que para ele fazia muita diferença. Naquele momento ele fazia de mim mulher, eu me tornava sem saber, adulta... Alguém!
Ele teve que operar, ficou muito tempo com o braço engessado. Sofreu coitado! E não sei se é como fardo para meus ombros culpados ele continua a me agradecer pelo cuidado que tive com ele.

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