domingo, 1 de abril de 2012

A maior responsabilidade da vida


Muitos passaram por mim, mas poucos me reconheceram. Muitos olharam para mim, mas poucos me viram. Essa não é uma reclamação chorosa de uma moça coitada que quer ser vista. Essa é uma constatação do mais lamentável fato daquele momento. Todos estavam ali, sentados em volta daquela mesa de um restaurante italiano. Deveriam ter mais ou menos vinte pessoas. Eu não consigo me lembrar muito bem. Eram tantas pessoas que eu mal conseguia ouvir meus próprios pensamentos, imagina minha voz ou a voz de outra pessoa. Era impossível. As conversas se embolavam. Para mim ninguém dizia de fato algo de relevante. De certa forma aquilo era um grande alivio para minha alma que gosta tanto do silencio, de passar imperceptível ante as situações. Mesmo que aquele fosse meu momento, afinal eu estava completando trinta anos, ainda assim me apetecia de forma gostosa o fato de que minha pessoa não era o foco de nada. Mesmo no momento do bolo, outras pessoas apagaram a vela pra mim. Que plenitude, eu tinha quem apagasse a vela de aniversario que estava em cima do meu bolo. Esplêndido. A festa demorou cerca de cinco horas o que pra mim pareceu uma eternidade. É meu azedume estava além do normal. James olhava pra mim e dizia “mulher como você pode ser tão alheia assim?” Eu dava de ombros e não me importava com sua opinião. Quando enfim a última pessoa se foi com uma despedida melosa e dizendo que fazer trinta anos era uma dádiva eu respirei aliviada. Sentei informalmente de pernas abertas e acendi um cigarro. ‘Trinta anos. Caramba estou realmente ficando velha. ’ Foi o primeiro pensamento que me ocorreu. Quem em sã consciência gosta de fazer trinta anos? Pensando por mim, acho que ninguém. Eu ainda era formosa. Eu ainda deixava algum cara apaixonado por mim. Tudo bem que isso já não me interessava mais. James estava comigo já algum tempo e eu de certa forma o amava até mais do que imaginei algum dia amar alguém. Eu estava grávida, mas ele ainda não sabia. Estava esperando que ficássemos sozinhos para que eu contasse. Por mais que o mundo me fazia desgraçadamente triste com o quadro do ser humano no coletivo, estar grávida e saber que poderia ensinar a alguém como ser melhor me davam um novo fôlego para continuar querendo respirar. Tinha certeza que James também iria gostar. Poxa, nosso primeiro filho depois de muitas tentativas frustradas. Pagamos a conta que de forma escandalosa nossos amigos deixaram para que nós pagássemos e fomos embora. No caminho de casa eu acendi outro cigarro, foi então que pensei ‘caramba você tem que parar de fumar, afinal está grávida. ’ Aquilo me deu um aperto no peito. O cigarro sempre fora uma boa companhia pra mim, mas um filho deveria ser mais importante. De qualquer forma aquele cigarro não iria fazer mal algum. Fumava meu cigarro, enquanto James colocava o velho e bom The Doors pra tocar. Minha música preferida Moonlight Drive. Geralmente James é sempre muito calado e naquele dia não foi diferente. Especialmente naquele momento eu agradeci aos céus por ele ser assim. Eu queria o silencio da música dos Doors. Eu pensava em uma forma de contar a ele que estava grávida. Depois de muito pensar cheguei à conclusão de que não existia uma forma certa, era chegar e dizer ‘James estou grávida e dessa vez parece que vingou.’ De certo ele ficará feliz. Depois que seu romance saiu e foi consagrado como um dos mais bem elaborados de todos os tempos, nossa situação financeira melhorou consideravelmente e eu já estava com trinta anos. Já era mais do que hora de termos um filho. Chegando em casa, tirei os sapatos. Fui pro banheiro e tomei um banho demorado. Enquanto tomava banho refletia sobre toda a minha vida. Parecia que tinha sido ontem que eu era uma menina desgraçadamente pobre e sozinha. Agora estava ali, em um banheiro com blindex no box e uma boa ducha que me proporcionava um agradável banho naquele momento. Sai do banho e coloquei um vestido fresco. Me perfumei e fui para a sala. James estava sentado vendo televisão. Eu odiava televisão, especialmente o programa preferido dele.
_você está cheirosa_ ele me disse.
 Sorri, agradeci e me dirigi à cozinha. Eu devia ser a pior mulher para um homem como James. Sempre gentil, agradável, amigo e me elogiava constantemente. Eu era seca, distante, porém o amava demais. Acho que ele sabia disso. Peguei um copo de água e me sentei ao seu lado.
_Precisamos conversar.
_Claro minha linda.
_Tenho uma noticia, que acho te agradará demais.
_Diga meu amor.
_Enfim estou grávida.
_Que maravilha!
Exatamente como eu previa. Ele ficara feliz. Me abraçou e ficamos um tempo bom assim, felizes e maravilhados com a boa noticia. Eu estava grávida. James me disse dos seus planos se fosse menina e das aventuras que pretendia viver caso fosse menino. Eu o escutei calada, apenas sorrindo e assentindo com a cabeça para tudo que ele dizia. É, acho que eu era feliz. Me ajeitei melhor no sofá, James me abraçou. Como que em um impulso o abracei forte.
_Seremos felizes com essa criança, eu peço a deus que ela venha igualzinha a você._ Eu disse.
Ele me beijou a testa e ficamos ali sentados, vislumbrando um futuro ainda distante. Eu tinha trinta anos e carregava comigo uma das maiores responsabilidades da minha vida. Mesmo assim eu ainda conseguia acreditar que aquilo era bom.

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